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Fábrica de Histórias

por Closet, em 18.03.12

 

Já escrevi sobre o meu pai para a Fábrica, sobre o tema herói, aqui.

Apresentei-o a ele, a nós, com nomes fictícios.

Se ficou muito por dizer? Tanto!

Decidi escrever hoje sobre coisas mais divertidas, porque vivemos os dois sozinhos durante 5 anos e não me lembro de estar zangada com ele mais do que 20 minutos! Não é propriamente uma história, são histórias da nossa vida!

 

 

As coisas que o meu pai consegue

 

Tirar-me do sério (a nossa conversa há 1 hora atrás)

- "Mas filha, vamos almoçar amanhã porquê, se vamos almoçar na 4ª feira com a tua irmã?"

- "Paizinho, porque é dia do pai e eu costumo oferecer-te o almoço, lembras-te?"

- "Mas já vamos na 4ª feira, para que vamos almoçar duas vezes seguidas?"

- "Pai, é DIA DO PAI! Estás a dizer que não queres vir almoçar comigo?"

Ele vem, pronto, ele vem, não muito convencido do "para quê" mas vem... 

 

Dar-me a volta

Vinha eu eufórica com um panfleto de um curso de teatro juvenil os Lobitos, eis que ele convenceu-me a substituir esse curso por... alemão.. isto com 14 anos ... (é que tem tudo a ver, e sentia-me uma verdadeira aberração sempre que pronunciava algo em alemão junto dos meus amigos).

 

Ver sempre o lado positivo 

E nesta podia dizer muita coisa... mas não esqueço quando ele esteve internado há 2 anos com um grave problema circulatório, no qual estava em risco a amputação de uma perna ou pé ou dedo.  

- "Filha, olha, é só um dedo!"

- "Mas tem mesmo de ser?"

- "Oh filha, deixa lá, que falta me faz?"

 

Substituir um GPS

E aqui tenho de tirar-lhe o chapéu. Para qualquer lugar novo onde eu vá sozinha ele faz questão de traçar-me o caminho e descreve-lo pormonorizadamente, com direito a "faixa de 2 sentidos" e "rua de sentido proibido" (ok, isso é importante para mim) e a locais onde posso estacionar, descrevendo as cores e formas do sinais de trânsito desse local. Posso dizer que esta tarefa muitas vezes requer-lhe uma ída prévia ao local (sim, porque para ele o pc é um objecto desnecessário e o googlemaps é uma modernice fajuta).

 

Dormir na sala 1 semana

e não, o quarto não estava com infiltrações, pintado de fresco ou com algo corrosivo no interior... foi mesmo só porque uma pequenininha osga pernoitou no quarto dele sem pedir licença, osga essa que nos obrigou a matar e mostrar-lhe o cadáver... ainda assim fez uma semana de luto ao quarto, não fosse as amigas dela virem ao funeral...

 

Dizer as coisas mais insensiveis com a maior naturalidade

e pior sem perceber que as diz...

- "oh filha, pois habitua-te às dores, olha que já não vais para nova"

- "pfff"

 

- "Mas estás a fazer esse curso de escrita há tanto tempo para quê?" 

- "Porque eu gosto, é um escape"

- "Mas não era melhor vires para casa sossegadinha cuidar dos miúdos?"

- "Pai, eu disse escape, e eu gosto de escrever"

- "Mas não podias escrever em casa?"

 

Andar em casa de robe em pleno Agosto

e de vassoura na mão, porque a minha gata ficou doente e atacava (e estava mesmo doente, vá)... mas lembrar-se de prender a gata na varanda, hã?? nãaaaa... Lá tive eu de vir recambiada de um campo de férias para salva-lo!

 

Ser incovenientemente sincero

- "Pai, lembras-te da minha amiga Susana?"

(depois de várias dicas e sorrisos da Susana)

- "ahhh já sei, olá Susana... mas naquela altura tu eras muito gorda, não eras?"

- "Pai, ela estava grávida..."

- "Ahhh, mas era gordinha"

 

No dia do meu segundo parto, cesariana marcada, no meu quarto do hospital:

- "Filha, já estás aqui, agora vou comer qualquer coisa ao bar que estou cheio de fome"

- "Pai, eu também não como nada há 10 horas e não quero ficar aqui sozinha no quarto à espera"

- "Eu vou só comer, depois se te vierem buscar tu vais lá com eles, não te preocupes que eu fico aqui à tua espera"

 

Ser mais despistado que eu

e aqui é dificil...

- "Deve estar para ali" (o carro)

- "Pai, ali onde? Já passámos por ali."

- "Ali, já passámos por ali?... ah espera, eu vim de autocarro"

 

Ter um acidente num autocarro

e lá fui eu busca-lo à unidade de ortopedia de Santa Maria porque o autocarro onde ele ia bateu, uma senhora caiu-lhe para cima e fez-lhe uma luxação qualquer no pescoço (a senhora, note-se), para além disso ainda esteve em observação devido a possíveis cortes da chuva de vidros que levou causada pela queda da dita senhora que partiu um painel junto à porta (a mulher devia ser um bizonte...). Quando lá cheguei, com direit a crachá da ala de ortopedia só me disse:

- "já viste isto? vai uma pessoa sossegada num autocarro..."

 

 

E poderia continuar a contar histórias do meu pai. De como sabe o nome de todos reis, e presidentes, e ministros, os nomes e capitais de todos os países e principais monumentos... "Filha, não me digas que não sabes?" E eu? Sou uma nódoa...  De como passávamos as tardes de Sábado a beber umas cervejas e comer tremoços, ele com o Expresso relatando-me as notícias que eu a fingir ouvir enquanto folheava as revistas sociais! Dos nossos almoços ao Domingo de cozido à portuguesa no restaurante de sempre, dos passeios que dávamos sem destino ao fim-de-semana onde a conversa nunca se esgotava, normalmente ele a tentar cultivar-me! Mais do que um pai, é um companheiro único, incomparável... E eu? Às vezes sou resmungona, mas tenho a sorte dele nem ligar e telefonar-me todos os diazinhos e estar sempre pronto para o que eu precisar.

 

 

Testo escrito para a Fábrica de Histórias.

publicado às 22:19


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