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Fábrica de Histórias

por Closet, em 05.02.12

 

 "Automat" de Edward Hopper

 

Café curto 

 

Talvez faltasse música naquele bar. Quer dizer, havia música, mas tocava baixinho numa melodia triste e apagada.

Faltavam risos de conversas, o trocar de beijos e abraços. Até os amuos e birras de um casal ao lado. Nada. O bar estava sozinho. 

 

Podia ouvir o bater da colher na chávena enquanto mexia. Um ruído metálico, agressivo, como se alguém discutisse consigo. O tilintar da colher dizia-lhe para parar, mas como que enfeitiçada continuava a mexer o café, repetidamente, por castigo. Como se quisesse ouvir um pouco mais aquela voz que a perfurava, no silêncio abrupto que ocupava aquele espaço vazio.

 

Envolvia o café, já sem a espuma à superfície que a iludia. Reconhecia, naquele líquido curto escuro, o caminho sinuoso que percorria. O açúcar, que rapidamente desaparecera, o doce que fora engolido pelo amargo, como a sua vida.

 

Parou subitamente de remexer todos aqueles pensamentos que a incomodavam, as memórias que a confundiam. A respiração no seu pescoço, os braços pelas suas costas, a despedida. Queria afoga-las a todas no café que fumegava à sua frente. Mas não conseguia.

Bebeu-o de um só trago, esperando que o líquido ardente pudesse queimar tudo o que sentia.

 

Texto escrito para a Fábrica de Histórias

publicado às 22:56


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