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«Há tanta, tanta gente neste mundo, todos à espera de qualquer coisa uns dos outros, e, contudo, irremediavelmente afastados« Haruki Murakami
Hoje esteve muito frio. Por isso...na azáfama habitual de sair de casa com os miúdos ainda me lembrei de levar-lhes um gorro "sim, porque deixo o carro num parque perto do colégio e e ainda temos de ir a pé um bocadinho"... Cheguei ao parque, já em contra-relógio, como sempre, e disse para trás "ponham os gorros" e ao abrir a porta de trás deparo-me com os dois de gorro na cabeça mas só com a bata vestida...qual casaco?? "para dentro, já, está frio" gritei aflita e toca a enfiá-los no carro e a tentar, no meu super-mega-tecnológico telemóvel touchscreen, ligar para o meu marido que ainda tinha ficado em casa... o coitado lá teve de voltar para trás a buscar os casacos para deixar na escola e eu deixei-os à porta depois de um ralhete ao mais velho "tens de te lembrar de trazer o casaco.. agora.não vais para o recreio"...ele desata a chorar que queria ir brincar, claro..."ok, pronto, vai, mas corre filho, corre para não teres frio" e lá desdisse tudo... que nódoa... e lá fui outra vez deixar o carro no parque rosnando esta minha capacidade inata de despistanço e ainda por cima de ter dado o ralhete na criança de 8 anos..."queria lá ele saber do casaco? tinha era na mão a bola saltitona que tinha trazido emprestada do amigo"... confesso, que passei o dia num aperto e só descansei quando cheguei a casa e lhe disse que ele não tinha culpa nenhuma, que eu é que me tinha esquecido do casaco...
Ser mãe não é fácil...somos muitas vezes demasiadas exigentes, injustas... não sei sequer qual a poção mágica para não errar... mas no meio dos meus (muitos) erros, penso neles, analiso-os, e tento compreender-me para explicar-me depois aos meus filhos... acho que é um começo.
Uma pessoa que eu adoro vai ser mãe, uma mãe excelente, não tenho dúvidas, mas está naturalmente apavorada...so what? O desconhecido assusta!
Tenho lido umas crónicas de Eduardo Sá que me têm "tocado" também sobre este tema e acho que consigo aqui reunir uns pedacinhos que, para mim (e o autor que me perdoe o mix) fazem todo o sentido para o desejo-pavor de ser Mãe.
"Muitas pessoas transformam a vida num espantalho. De cada vez que espantam os medos ficam mais presas a eles. É por isso que sendo grandes, se sentem (por dentro) desamparadas. Mais ainda, porque já perceberam que amar é sermos pequeninos (aliás amar é podermos (...) ser de colo outra vez)."
É dificil crescer, deixar de ser "a filha", passar a ser "a mãe", deixar de "ter o colo" para passar a "ser o colo"... eu sei!
Talvez por isso "Muitas pessoas receiam desenhar um rumo para aquilo que desejam. Parecem sentir a vida como um barco sem leme, por não terem quem, olhando consigo, faça de farol e de horizonte ao mesmo tempo, tornando os sonhos navegáveis e dando novos mundos a todos os desejos".
Um filho muda a nossa vida, muda-lhes o rumo,muda-nos por dentro, transforma-nos... mas leva-nos a lugares que nunca antes visitámos, a paraísos que jamais poderíamos imaginar...um filho é um mundo por descobrir, a cada dia, "são as janelas com que apanhamos sol por dentro" e nos tornamos num ser humano melhor...não tenho dúvida que todas as dificuldades iniciais são amplamente compensadas... e com calma e paciência, o nosso Eu, deixa de ser só a mãe, e tem vida própria, tem essência, profissão. Porque todas nós somos "muitas"...e ainda bem!
E para terminar, porque apesar de algumas amigas acharem que sou excelente mãe... e eu encontrar em mim um monte de defeitos (sim, na verdade os meus filhos têm a benção de ter uma empregada-bábá maravilhosa, uma avó única e um pai perfeito...), reconheço que todos os pais erram de vez em quando...
"Todo o coração tem os seus degraus. Logo que se conquista um, sobe-se ao céu. Sempre que nos deslumbramos nele, cai-se... pelas escadas a baixo. Todo o coraçao tem os seus degraus. E o dos pais não foge à regra. Mesmo que o imaginemos como clarão. Excelentíssimo. Que acolhe, acalenta e adivinha. Mas nem todos os pais sobem os degraus capazes de colorir o coração de uma criança. Perdem-se nalgum.(...) Basta que não cresçam connosco. E que não casem a complexidade com a simplicidade. A complexidade dos desafios com a simplicidade que se inventa para lhes fazer frente. (...) Porque todo o coração tem os seus degraus. E nem todos os pais sobem os degraus capazes de colorir o coração de uma criança sem que se deslumbrem a seguir".
Se assusta?? Deveras... é talvez o maior desafio crescer com eles, subir devagarinho e ao mesmo passo cada degrau da sua vida...não é preciso ir atrás, nem à fente...acho que o segredo é ir lado a lado, e escutar com o coração.