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Fábrica de Histórias

por Closet, em 22.01.12

 

 

Passar do Tempo

 

Não é o medo da morte, nem o receio da dor.
Não é o horror da pele fina e engelhada. Tão pouco as rugas de expressão a marcar o rosto.
Não são os cabelos a nascerem brancos e fracos. Ou as pernas a cansarem-se, os pés dormentes, por subir um lance de escadas só. Nem é o facto de me darem lugar nos transportes, ou sequer o eco da palavrinha quando me chamarem avó.
Nada disso me assusta, tira o sono ou faz tremer.
É muito mais.

É saber, a cada instante que passa, que ele já passou. Morreu. Não volta atrás. Que certos momentos não vão repetir-se, que na verdade todos eles são já memórias de sensações. Imagens cada vez menos nítidas com que constantemente sonhamos, gravadas a ferro no nosso inconsciente. Sentimos-lhe o cheiro, e o ardor no peito como antes, mas a certa altura há uma névoa que nos atordoa. Já não sabemos se os imaginamos, se os vivemos efectivamente. 
Mas ainda não é isto, ou não é só isto. É mais profunda a tortura que sinto.
É a angústia permanente de que o tempo passa por mim a correr, que não o consigo agarrar, nunca o alcanço como desejaria.
Pior, que nem sei o que agarrar, se o que verdadeiramente procuro existe ou é mera fantasia.
Como se me arrastasse com o vento sem direcção, envolta numa imensa neblina. Os ponteiros vão rodando rapidamente, como uma bomba relógio que se aproxima. Há a explosão, sempre, a esperada, consequente. 
A eterna insatisfação que se apodera de mim e agita o mundo encrespado onde habito e isolo sem fugir. A ânsia permanente de chegar a qualquer parte, para logo depois querer partir.
A indecisão premente. O impulso que não sucumbe. Do pânico, claustrofóbico, de não encontrar o que me complete, me deslumbre.
A paz que me acalme a alma e sacie a chama do corpo ardente.
Existir apenas, uma vida inteira, sem partilhar o silêncio translúcido que me envolva, num colo abraçado de conforto.
O medo, sufocante, de saltar o fogo crepitante para deixar-me planar até à morte num equilíbrio morno. E nessa apatia que me assusta, do tempo que tenho pela frente, só peço que o sorriso não me doa a face, triste, por ser apenas adorno.

 

Texto escrito para a Fábrica de Histórias 

 

 

 

 

publicado às 23:52


4 comentários

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De CoisasDeTudo a 23.01.2012 às 14:33


Uma coisa que muitas vezes me preocupa e me tira até algum sono (e que este post me veio recordar), é mesmo esta concepção que as pessoas me apresentam sobre o tempo... Dizem que a partir dos 18 anos a vida passar a correr... Espero não comprovar isso!

Que cada momento que se deixa para trás seja para nós marca de que aconteceu, e de que o fizemos da melhor forma.

Abraço,

Daniela Leal
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De Closet a 27.01.2012 às 22:15

Daniela, não sei se é depois dos 18, se é cada vez maior esta sensação... eu já tenho esta "doença da idade" há muito tempo, e só tem vindo a piorar (só de se aproximar o meu aniversário já estou em depressão!!)... mas tenho esperança de um dia, quando já for bem velhinha, me venha a curar pelo cansaço!!
Abraço apertadinho!
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De Ametista a 20.02.2012 às 02:53

Não consigo tecer qualquer tipo de comentário.. fiquei comovida (a sério)..

Beijinho grande
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De Closet a 20.02.2012 às 10:35

Esta é a minha luta diária comigo...
Um beijinho grande querida Ametista!

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